14/07/2021 Cozinhas fantasma se espalham por São Paulo durante a pandemiaO cliente pode não saber, mas o lanche que chega em casa após um pedido pela internet muitas vezes vem de um negócio em expansão que já chama a atenção na capital paulista —e não apenas pela comida, mas, em alguns casos, por incomodar vizinhos. São as dark kitchens, ou “cozinhas fantasmas”, onde não se pode comprar nada presencialmente. Segundo o Procon, o consumidor corre o risco de levar “gato por lebre”. Elas funcionam em galpões administrados por empresas e que normalmente reúnem várias cozinhas juntas, que pagam um aluguel pelo espaço. As dark kitchens se tornaram atraentes no delivery porque conseguem ampliar a área de atuação dos restaurantes em aplicativos. Uma lanchonete badalada que só atenderia em Pinheiros (zona oeste), por exemplo, pode ter uma “cozinha fantasma” na zona leste e, com isso, diminuir o tempo para levar um hambúrguer no agora vizinho Tatuapé. Ela entra no “radar” de quem mora no bairro distante do restaurante físico, aquele onde o cliente paga caro e até vê a comida sendo preparada. Em alguns casos, o dono do restaurante conhecido e o da dark kitchen nem são os mesmos. O responsável pela “fantasma” paga até 8% do faturamento como royalties para usar a marca do famoso. E prepara o lanche em um cubículo, num galpão onde pode ser feita de comida vegana à japonesa. Na teoria, tem que cumprir requisitos de qualidade. Na prática, segundo empresários e funcionários, nem sempre isso acontece. O consumidor pode pagar caro só pela embalagem. A reportagem foi a oito endereços que servem de dark kitchens. A prefeitura disse que três foram notificados para que regularizarem a situação —dois, nas ruas Cação, no Itaim Bibi, e Fradique Coutinho (Pinheiros), zona oeste, não tinham nem licença de funcionamento. Outros dois locais seriam vistoriados pelas subprefeituras da Sé (região central) e da Mooca (zona leste) nos próximos dias. Informado sobre essa atividade, o diretor-executivo do Procon-SP, Fernando Capez, disse que é “assustador”, porque o consumidor tem como referência a higiene do estabelecimento e da cozinha na qual imagina estar fazendo o pedido. “Claramente, uma prática abusiva”, diz. Segundo Capez, o artigo 31 do Código de Defesa do Consumidor é suficiente para perceber o problema. “Tem que dizer: ‘esse produto está sendo elaborado fora do estabelecimento, nas seguintes condições’. Se não fizer isso, está, usando a linguagem popular, vendendo gato por lebre.” O diretor do Procon detalha aquilo que vê como uma irregularidade. “Tenho o local onde vou, com uma identidade visual, uma confiança, onde conheço todas as condições de higiene e funcionamento. De repente, está sendo fornecido em um endereço completamente diferente, do qual não tenho informação sobre as condições de produção, acondicionamento, manutenção e higiene”, explica. Professor da Faculdade de Saúde Pública da USP e especialista em vigilância sanitária, Fernando Aith cita, entre outras coisas, a responsabilidade de quem aluga essas várias cozinhas em um único galpão em declarar o que de fato acontece lá. "[Pode haver] desvio de finalidade comercial, o que é uma burla ao controle do estado, relacionado à proteção do consumidor", afirma. Fonte: Folha de S.Paulo |